
Nos olhos dos personagens de Soledad (Irene Menéndez Hastings) e Darín (Benjamín Esposito) reside boa parte do “segredo” do título: o amor presente, nascente, crescente, visualmente dialogado mas nunca verbalizado (a não ser tendo o papel como intermediário). Além de no relacionamento mudo do casal principal, o “segredo” mora nos olhos de Isidoro Gómez, considerado culpado pelo crime que movimenta a trama – e mora duas vezes: no olhar pidão que ele dirige à vítima, Liliana, e no olhar devorador que pousa sobre o decote de Irene. O “segredo” mora também nos olhos de Ricardo Morales, marido da jovem assassinada – olhos que caçam o suspeito implacavelmente, mas que são, no dizer de Benjamín, “olhos de puro amor” em tudo que se refere a Liliana. Interessante notar que os olhares de Benjamín, investigador do assassinato, “rimam” e se misturam com os dos personagens que deste participam: a câmera fotográfica o flagra tão encantado por Irene quanto Gómez por Liliana, e não há um só momento em que ele não imite Morales nos “olhos de puro amor” dirigidos à amada.
Para quem se animou ao ler “assassinato”, um porém. Embora seja a espinha dorsal do enredo, o crime não envereda por investigações mirabolantes e se presta, antes, a servir de base para análises psicológicas, pretexto para críticas políticas e – principalmente – espelho de sentimentos e vivências do protagonista. Mais pessoal do que factual, El secreto é história de espírito machadiano, em que as impressões e memórias são filtradas pelos olhos (eles aí de novo!) alheios, tal qual em Dom Casmurro ou no famoso conto “Missa do Galo”. São segredos de liquidificador, como diria Cazuza – lembranças, simpatias, opiniões pessoais batidas no mesmo suco com os fatos e as informações objetivas. Bebe-se relatividade. No decorrer de toda a trama, há pequeninas pistas de que o que estamos vendo pode não ser 100% fiel aos acontecimentos, ao mesmo tempo que não há provas de que não seja. Isso é muito bem representado na metáfora da tecla que falta na máquina de escrever de Benjamín: falta-nos também, por vezes, esse elemento que poderia “fechar” cada frase do texto, esse elo perdido que nos levaria à terra de todas as certezas. Entretanto, como prova Benjamín ao fim da trama, é perfeitamente possível dispensarmos essa “tecla” e completarmos as lacunas por nós mesmos. Coisas de pós-modernidade, coisas de Machado. Não é uma narrativa “cheia de nadas” – como a vida que Morales deseja para quem o afastou de seu amor –, é uma história repleta de tudos: os muitos silêncios falam eloquentemente, de maneira doce ou perversa. Uma história sem únicas respostas, na qual – diria Guimarães Rosa – mais se aprende ao fazer outras maiores perguntas.