27 de out. de 2008

Sonhos de uma summer night

Casal bonitinho se conhece, fica a fim, se separa, se reencontra no colégio. Mas ele – o garoto mais popular – e ela – a menina mais boazinha – fazem parte de grupos diferentes. Rola dificuldade e muita música chicletona. No final, estão juntinhos. Todos estão juntos, todos cantam e todos estão felizes em... Rydell High. Isso, claro, não é o que você estava pensando; é Grease – trinta anos atrás. Em 1978, o mundo era muito mais inocente. Só que o musical-fenômeno da época, por trás do açúcar, não era: insinuações safadinhas entre os acordes de "Summer nights", suposta gravidez adolescente, aborto cogitado, mocinha que solta a franga e, pra chegar no cara, incorpora a bad girl (com roupitcha de couro preto meio sado, meio popozuda).
Em 2008, o mundo é muuuuito menos inocente. Só que o musical-fenômeno de nossa época, por trás do açúcar, tem um tantão mais de açúcar – e é inocente pa-cas. A história-piloto continua a mesma: férias, casal bonitinho, a fim, se separa, se reencontra, mas ele... mas ela... canções, chicletice, juntice. Todos cantam, todos estão felizes em East High, no mundo inteiro – e nas duas seqüências que só aumentam o fanatismo em torno da franquia High School Musical.
Fascinante e delicioso paradoxo de nossos dias. Alguém sabe me explicar como é que um musical dos mais musicais consegue atrair tantos meninos, sempre tão avessos ao gênero? E como é que eles adoram o clima romântico da trilogia? E como é que, numa era de crianças de dez anos que já estão no octogésimo beijo (e, às vezes, no primeiro filho), há tanta euforia em torno do romance castíssimo de Troy e Gabriella, que só trocaram smacks no segundo filme? High School é inexplicável, incompreensível, maravilhoso. Bolha de delicadeza que não deve nada a uma Moreninha da vida. Com valsa e tudo. Nessa máquina do tempo inesperada, até pegar na mão é um processo longo e suave – e, não à toa, o primeiro beijo do casal foi celebrado como gol de final de Copa. Uma delícia.
E o terceiro filme?... Lindo, fofo e comovente para quem viveu de perto o romance-doçura de Troy e Gabriella, os bancos de East High. Não há canções tão boas quanto no episódio-piloto, o mais melódico dos três. Mas os números musicais estão cada vez mais sofisticados – e, afinal, a intenção não é julgar. A intenção é chorar com as frases que já sabemos que vamos ouvir, e chorar mais ainda ao vê-los de beca, nossos meninos, que orgulho!, ao som lentinho de "We’re all in this together". Depois eles encerram o filme mais teatral da série curvando-se para nós, olhando-nos nos olhos antes de sumirem por trás da cortina vermelha. A gente sai de olhos também vermelhos e pronto. High School não é só pegar uma sessão: é embarcar numa proposta, suspender a crítica, voltar à infância do mundo, a um refúgio colorido de paz. Mesmo os adolescentes que torcem o nariz para as morenices literárias adotam as de Gabriella, e as menininhas, que aqui fora namoram bandidos, suspiram por Troy – o novo príncipe, artista, esportista, cavalheiro, bom moço até a medula. Esses suspiros e sonhos não podem ser só ficção. Nem mentira. Talvez saudade do que, aqui fora, fingimos tristemente não fazer mais falta. This could be the (re)start of something new.

20 de out. de 2008

O poeta do Ó

Aproveito o dia frio, chuvoso e cinzento para render uma singela homenagem àquele que foi, continua sendo e será sempre um dos mestres da poesia contemporânea, quiçá da poesia universal – o inigualável, o inestimável, o inenarrável, o inencontrável, o inenrugável Pedrinho da Silva, também conhecido por muitos como "o lírico da baixa modernidade".
Para aqueles que guardam a petulância de jamais de haver lido ou escutado um de seus ultramagistrais poemas e para aqueles que simplesmente ignoram a presença onipresente desse patrimônio da cultura – hoje reverenciado por críticos do quilate de Silviano São Tiago, Harold Blue e Afonso Romeno de Sant'Anna –, reproduzo abaixo uma de suas incontáveis pílulas de genialidade, o belíssimo "Ó!":

Ó! O fonema dos fonemas!
Ó! A letra das letras!
Ó! A palavra das palavras!
Ó... Ó!

Quem quiser saber um pouco mais sobre a obra desse gênio de todos os tempos, basta procurar na internet os seminais estudos realizados pelos professores doutores do Departamento de Letras Neogóticas da Universidade de Thywklwythghington, em Bhrikdbtony. Neles, é possível vislumbrar esse lastro de História, um tesouro de valor incalculável – que, por muito pouco, não foi eternamente soterrado por uma asquerosa política de interesses. Ó, poeta amado, salve, salve!

15 de out. de 2008

"E" de escola

Faz um mês que minha vida mudou. Não sou mais só blogueiro e revisor de textos. Agora sou professor também. Comecei a dar aulas de Língua Portuguesa numa escola municipal do subúrbio carioca. Tenho duas turmas de sétimo ano (antiga sexta série) e uma de oitavo (antiga sétima). Muitos alunos, especialmente os do sétimo ano, são bem fracos. Não entendem os enunciados dos exercícios – ou não tentam entender. Poucos conseguem ver a diferença entre um substantivo e um verbo, um adjetivo e um pronome. O máximo que fazem é copiar o que ponho no quadro, e olhe lá. Alguns nem abrem o caderno – quando têm um caderno. Outros são mal-educados à beça. Falam gritando, cospem ironias, andam pela sala, só pensam em escutar mp3. E ainda há os que estão com os hormônios à flor da pele, cujo mundinho se resume a uma xereca (no caso dos meninos) e a um pau (no caso das meninas). Mas tudo isso é o de menos. O pior mesmo é ter que ouvir de alguns alunos que não vão ler o texto ou copiar a matéria porque são bandidos. Porque são bandidos. Uns dizem isso só para me assustar. Outros, porém, repetem essas palavras com uma resignação de dar pena. De dar pena do nosso futuro.

12 de out. de 2008

Alô, criançada!

O vídeo acima e o post inteirinho são dedicados especialmente àqueles adultos bobos, feios, chatos e caras-de-mamão, que têm vergonha de ter gostado de tantas "coisas bobas" na infância, que se dizem "muito velhos" para se jogar numa piscina de bolinhas coloridas, que acham ridícula a idéia de comemorar o próximo aniversário numa casa de festas infantis, que não se lembram de um refrãozinho do Trem da Alegria (no caso da minha geração), que resolvem pegar um avião e visitar um monte de parques temáticos "só" por causa dos filhos, que não conseguem imaginar o que uma criança sente, mesmo que tenham sido crianças por tanto tempo.

A todos os Darth Vaders da vida, que perderam o que tinham de melhor e ficaram apenas com os restos-de-pessoa que precisam respirar artificialmente, que jogaram o espírito da meninice fora e vivem uma existência mutilada e no Lado Negro, eu só gostaria de lembrar: amadurecer é conservar a infância no melhor sentido. É guardar na sua caixa-forte – com cadeado, cerca elétrica e alarme antifurto – tudo que foi bom, tudo que você foi e viveu em cada momento de sua história.

Ser adulto não é deixar de ser criança. É tornar-se uma criança melhor, aperfeiçoada, uma pessoa feliz, aberta ao mundo, sem preconceitos, capaz de se surpreender e de criar. Esquecer o que vivemos, mesmo – ou principalmente – as tais "coisas bobas" da infância, é esquecer o que aprendemos. Se a cabeça pode um dia esquecer isto ou aquilo, o coração não pode – jamais.

5 de out. de 2008

Em busca do tempo – perdido?

Pode ser uma fotografia desbotada e alegre, tirada com aqueles filmes de 24 poses; pode ser uma canção antiga do Balão Mágico ou da Xuxa; pode ser o cheiro de um perfume que a vovó só usava no Natal; pode ser um brinquedo velho da Estrela; pode ser um filme com aqueles monstros recriados em stop-motion; pode ser um cartucho empoeirado do Atari; pode ser um time de botão guardado numa caixa de margarina; pode ser a embalagem colorida de um biscoito que não é mais fabricado; pode ser o pátio da escola do nosso primário ou ginásio; pode ser um gibi do Tio Patinhas que lemos trocentas vezes na infância. Tudo, mas verdadeiramente tudo, pode ser uma madeleine, como aquelas de Marcel Proust. Qualquer objeto, qualquer sensação – por mais insignificante que aparentemente seja – pode significar um mundo inteiro.
Esta semana, passeando pela internet, tropecei na imagem (e na receita) de uma das minhas madeleines, os blueberry muffins – as blueberries são umas frutinhas roxas, muito parecidas com as amoras, e os muffins são uns bolinhos muito fofos que os americanos adoram. Dar uma mordida numa delícia dessas imediatamente me teletransporta para Orlando, nos Estados Unidos. Lá, antes de cada Magic Kingdom, Epcot ou Universal Studios, tinha um café da manhã com direito a pão de forma torradinho com cream cheese, waffles, frutas e blueberry muffins! Os dias mais felizes da minha vida começavam com o sabor desses bolinhos! Nhami!
Hora dessas ainda conto um pouquinho das minhas aventuras na terra do Mickey Mouse. Por ora, deixo com vocês a receita dos blueberry muffins – que, se não conserva o poder de uma madeleine para todos, certamente tem o sabor mais-que-gostoso de uma gulodice feliz – e uma perguntinha boba, só para passar o tempo (ou recuperar um tempo "perdido" num cantinho da memória): quais são as suas madeleines? O que os faz lembrar "o" instante de suas vidas?

Blueberry muffin

Ingredientes:

2 xícaras de farinha;
2 colheres de chá de fermento;
3/4 de xícara de açúcar;
1 xícara de creme de leite;
2 ovos;
1 colher de chá de raspas de casca de limão;
1/3 de xícara de óleo;
1 ¼ de xícara de blueberries.

Como fazer:

Preaqueça o forno em 180 graus. Peneire a farinha com o fermento numa tigela. Adicione o açúcar e mexa para misturar. Noutra tigela, combine o creme, os ovos, as raspinhas de limão e o óleo. Misture bem e despeje na tigela de secos. Depois de mexer bem, com a mistura homogênea, coloque as blueberries na massa (agora sem mexer demais). Despeje a massa nas forminhas; a massa deve ficar a 2/3 da capacidade. Asse até os bolinhos dourarem levemente e passarem no teste do palito.

Bom apetite e boas lembranças!